Eu observava, do outro lado da
plataforma, um casal e seus dois filhos. Enquanto a mãe distraia e dava de
comer ao mais novo, o pai se divertia com a outra filha em uma brincadeira que
eu não conhecia mas que, certamente, era muito divertida.
Os pais, entre uma garfada aqui e
outra risada ali, se entreolhavam sorridentes. Era um sorriso puro, se via apenas
respeito, amor e sinceridade entre eles. Comecei a refletir sobre tudo à minha
volta; aos meus treze anos eu sonhava em ser pai aos vinte e um, e ser avô aos
cinquenta. Pensei nas namoradas que tive, nas oportunidades que perdi – e nas
que aproveitei mas não levei até o final.
Lembrei de amores roubados,
beijos escondidos, amores proibidos. Lembrei de você também, pois via naquela
mulher da outra plataforma o mesmo sorriso de quando nos encontrávamos ou,
então, de quando falávamos sobre família e eu lhe confidenciava o desejo de ter
três filhos. Ah, como eu amo o teu sorriso!
Via naquelas crianças uma
juventude inteira pela frente, repleta de alegria, amor e oportunidades e
sentia o dever de alertá-las sobre a importância de se agradecer a cada manhã
nova, a cada raio de sol que entraria pela janela. Sentia o dever de dizer:
ouçam seus pais sempre mas, sempre que puder, tentem mesmo que digam ser
impossível; queria dizer que lágrimas cairiam daqueles lindos olhinhos mas que,
lá no fundo, seria necessário e ajudaria na vida adulta; queria dizer que,
apesar de cansativa, a universidade e o conhecimento são necessários para que
se aça a diferença na vida de outras pessoas – e nas nossas também.
Sentia o desejo de alertar sobre
as aventuras do amor, precaver quanto às decepções e armadilhas, invejas e
tentativas de destruir o que eles haviam conhecido e vivido dentro de casa como
sendo o amor verdadeiro. Dizer que quando o coração doer, é porque a pessoa faz
falta de verdade; que quando houver lágrima logo depois vem o sorriso; que
quando houver pedaços, haverá como consertar basta deixar que o tempo sirva
como reparador.
Eram tantos conselhos para dar,
segurança para passar àquelas crianças. E eu senti o desejo, me levantei e
comecei a caminhar em direção delas.
O trem chegou, a porta se abriu
diante de mim e pude, então ir embora. Afinal, de que adiantaria dar a receita
de uma vida perfeita sendo que, na verdade, o que se espera de qualquer ser
humano é que viva de forma a errar e aprender com cada ação.
De que adiantaria uma receita só,
para produzir vários mesmos de um eu?
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